Foi com alegria e alívio que José Rubens Rodrigues da Rocha, mais conhecido em Juiz de Fora como “Olair”, recebeu a notícia de que o Centro Mineiro de Referência em Resíduos não fecharia as portas. Dos 51 anos de vida, 30 ele atua como catador. Olair conta que a notícia do possível fechamento do Centro por falta de recursos, deixou a todos da Associação Lixo Certo, da qual faz parte, apreensivos. “Eu aprendi e aprendo demais com o Centro. Não podemos nem imaginar como seria a vida do catador sem a capacitação oferecida pelo local”, afirma.
Olair relembra que antes de fazer os cursos do Centro não tinha o devido cuidado com o material que coletava, mas que por conta das capacitações oferecidas no espaço deixou de manusear produtos químicos e passou a fazer a coleta da forma correta. “Lá a gente troca experiência, conversa com outros catadores, e isso é muito importante, ajuda na construção da nossa identidade. Hoje nós percebemos que sem a organização, não teremos futuro como catadores de lixo”, conta lembrando que já chegou a passar por situações complicadas no Lixão de Juiz de Fora e que já percorreu outras cidades como Santos Dumont, Barcarena, Cataguases e Matias Barbosa.
Em Manhumirim, o Centro de Referência foi um diferencial na vida dos catadores da Cooperativa Aguapé. Apoiador do trabalho dos associados, José Weber relembra que a história de conscientização local começou em 2007, quando o lixão da cidade fechou. A partir daí ele e outros envolvidos com a causa se ajuntaram para criar a cooperativa, com o objetivo de que os catadores não ficassem desempregados e que prestassem serviço à Usina de Triagem e Compostagem.
O sucesso foi garantido, porque hoje os 19 associados prestam serviços à prefeitura colaborando com a coleta seletiva, que já chega a 95% dos bairros. “É uma satisfação saber o que o Centro não será fechado. Para os catadores lá é o local onde eles trocam experiência e se afirmam na profissão e aprendem como fazer corretamente a coleta. É um espaço de capacitação no qual eles realmente se sentem em casa”, relata.
Para Betão a manutenção do Centro, que foi uma das defesas do Bloco Democracia de Luta, do qual faz parte é um diferencial para o Estado. O deputado afirma que mais que uma profissão, o ofício de catador deve ser incentivado em Minas Gerais como atividade econômica que merece todo cuidado e proteção. “É uma profissão que merece toda atenção devido ao desgaste e as condições de exposição aos riscos no trabalho. Têm catadores que trabalham o dia todo, andando pelas ruas sem as mínimas condições de trabalho. Por isso manter o Centro é fundamental, porque não é um gasto do Estado, mas sim um espaço que eles poderão aprender mais e se capacitar sobre a sua profissão”, disse.
Entenda a polêmica
O Centro Mineiro de Referência em Resíduos (CMRR) é um programa do Governo de Minas, desenvolvido pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), por meio da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) e em parceria com o Serviço Voluntário de Assistência Social (Servas).
Alegando problemas financeiros, o Governo de Minas Gerais informou que “a crise pela qual passa o Estado inviabilizou a captação de projetos, o que levou o atual governo a propor seu deslocamento para a Cidade Administrativa. O encerramento das atividades no imóvel localizado na Rua Belém, em Belo Horizonte, seria no dia 30 de março”, conforme nota divulgada pelo Centro.
Apesar do anúncio, após reunião da Comissão do Trabalho, da Previdência e da Assistência Social, realizada no dia 29 de março, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), e com a solicitação do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis de Minas Gerais, ficou definido que serão mantidas no CMRR as atividades básicas. A estrutura inclui porteiro, faxineira, além das equipes para receber a documentação referente ao programa Bolsa Reciclagem. Na reunião, também ficou definido que seria criado uma comissão formada por representantes do governo e da sociedade civil para debater alternativas sustentáveis para manutenção do Centro Mineiro. Até que esse grupo se reúna e discuta o futuro do CMRR, atendimento básico será mantido.
Atualmente, 138 associações e cooperativas estão cadastradas no programa e em torno de 90 empreendimentos participaram do rateio da remuneração, com cerca de 1.300 catadores beneficiados a cada trimestre. Como resultado, entre 2012 e 2018 foram destinadas às indústrias de reciclagem uma média de 35.000 toneladas/ano de recicláveis.
O representante do Instituto Nenuca de Desenvolvimento Sustentável (INSEA) conta Minas é pioneira quanto a legislação de resíduos sólidos, sendo que o Estado é o único no Brasil que não permite a incineração do lixo. Ele conta que o Centro é fundamental para que os mais de 20 catadores que hoje atuam em Minas Gerais possam, cada vez mais, se capacitar e trocar experiências quanto a destinação de resíduos sólidos. “Mais que um espaço, o Centro é um elo entre catadores, sociedade civil, políticos e gestores dos municípios. Hoje ele (Centro) cumpre um papel fundamental quanto a implementação de políticas públicas de resíduos e reciclagem em Minas”, acredita
Raio X da profissão no Brasil
O último censo demográfico feito sobre pelo setor (2010) revelou que
existência de 387.910 pessoas no Brasil declararam que sua ocupação principal era: catadoras e catadores. O Sudeste é a região que mais concentra catadores, com 161.417 pessoas, o que representa 41,6%
do total do país.
A média de idade entre essas pessoas que declararam exercer a
atividade de coleta e reciclagem no Brasil é de 39,4 anos. Essa média
varia pouco entre as regiões. Outro dado preocupante é com relação a população de catadoras e catadores acima de 70 anos, que chega a 6,5%, idade considerada prioritária para as políticas de assistência e Previdência Social.
Fotos: José Rubens