Professores avaliam que metodologia reforça as desigualdades porque quem tem acesso à internet poderá tirar as suas dúvidas online e alunos que não têm vão anotar para sanar depois; SindUte diz que decisão de voltar às aulas é contrária à liminar que impede o retorno dos profissionais da educação
Sem diálogo e sem salário. No próximo dia 18 de maio profissionais da rede estadual de educação e estudantes voltam às aulas em modo remoto mesmo sem a secretaria de Estado de Educação ter achado uma solução que atenda à todos os alunos, podendo deixar de fora cerca de 700 mil sem acesso à internet em Minas. O cenário é ainda pior porque neste mês de maio, o governo do Estado, mesmo com o saldo positivo de recursos do Fundeb no valor de cerca de R$ 528 milhões, ainda não anunciou a data do pagamento dos servidores públicos da educação e só diz estar se “esforçando” para pagar todos os servidores do Estado.
Na prática, professores e alunos já temem dois cenários. Em uma ponta alunos sem acesso ao conteúdo por não terem internet de boa qualidade ou acesso a um professor em modo remoto para tirar as dúvidas, e de outro, profissionais da educação que passarão a trabalhar sob um regime de sobrecarga de trabalho, com destaque para os diretores, únicos que estão trabalhando presencialmente e serão responsáveis pela distribuição do material previsto pela Secretaria de Estado de Educação.
Vice-presidente da Comissão de Educação, Betão tem lutado em todos os espaços para que o governo tenha mais respeito com a categoria e que encontre uma solução mais democrática para o acesso à educação neste momento.
“Além de não anunciar a data do pagamento dos servidores da educação e não quitar o 13º para cerca de 50 mil profissionais, o governo lança um programa que não dialoga com o setor e que só reforça as desigualdades em tempos de pandemia. Isso é a cara do governo Zema, achar que soluções tecnológicas vão resolver o problema. Nada substitui o papel do professor, que precisa, mais do que nunca ser valorizado e respeitado agora durante essa crise”, afirma Betão.
Professor em duas escolas, Adebiano Robert Rodriguez Pereira trabalha na Escola Estadual São Pedro, na cidade de Piau, e também em outra escola na cidade de Simão Pereira, ambas em localidades com menos de 3 mil habitantes e com dificuldades para transporte de alunos e acesso à internet.
A sua avaliação é que além de prematura a retomada das aulas na forma como foi feita, e que vem sendo conduzida pelo governo, não tem sido feita de forma planejada. Ele conta que nos locais onde trabalha o governo falhou até ao enviar a quantidade correta de livros, revelando um problema estrutural e que, por exemplo, em uma de suas turmas há 16 alunos, mas que foram entregues somente 10 livros.
Sobre o lançamento do Planos de Estudos Tutorados (PETs), que são apostilas com o conteúdo das disciplinas, e do site www.estudeemcasa.educacao.mg.gov.br, além do programa “Se Liga na Educação”, que vai exibir aulas que serão transmitidas pela Rede Minas, de segunda a sexta-feira, nos dias úteis, sempre pela manhã, Adebiano reforça que não serão medidas democráticas e de fácil acesso a todos.
“Essa decisão tem sido feita sem diálogo nenhum. O site fala que o material foi feito com a ajuda de professores, mas isso não foi bem assim, não. O problema é que boa parte dos nossos estudantes não têm acesso à internet e muitos deles têm acesso à internet via celular, não tem nem computador em casa”.
Governo reforça as desigualdades
As apostilas são grandes e mal feitas. As do 3º ano do ensino médio tem 170 páginas e isso vai causar um susto no estudante. Os textos são, alguns deles, problemáticos, e a metodologia reforça as desigualdades, porque o aluno que tem acesso à internet poderá tirar suas dúvidas com o professor na hora. Já o aluno que não tem, vai anotar e quando for entregar e pegar a nova apostila é que ele vai poder enviar as dúvidas aos professores”, reforça.
Para Rodinéi Amélio, sociólogo e professor da Escola Estadual Diogo de Vasconcelos, em Belo Horizonte, “existem vários problemas nesse retorno às aulas e a medida não atende às comunidades como as quilombolas e ribeirinhas, além das cidades rurais, onde nem sinal de celular chega. A falta de estrutura tecnológica já acontece nas escolas públicas que não têm esses recursos para usar junto aos alunos. A imposição da Secretaria Estadual aos professores e alunos de querer educar via internet é sim uma incoerência”, afirma.
Sindicato reforça a luta contra decisão do governo
Em nota, o Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE/MG) mais uma vez reforçou a luta que tem sido intensa nas redes sociais, contrária à decisão do Governo de Minas sobre a retomada das aulas, lembrando, inclusive do não pagamento da categoria.
A presidente do Sind-Ute, Denise Romano, lembrou que foi afirmado que a liminar que suspendia a convocação dos servidores para trabalhar durante a pandemia da Covid-19 ainda está em vigor.
“A decisão do Tribunal de Justiça que suspendeu a convocação dos servidores da educação ainda está em vigor. Não teve nenhuma alteração. O Sind-UTE já informou ao Tribunal o descumprimento da decisão por parte do Governo do Estado”, informou também à imprensa.