Para Betão, caso mais urgente a ser discutido é o da cidade de Coronel Fabriciano, que poderá reabrir as escolas no próximo dia 25 de maio
Ao longo da semana, o mandato do deputado estadual Betão (PT) recebeu inúmeras reclamações sobre a condução da educação no governo Zema durante a pandemia, mas a mais grave delas, talvez, seja a da cidade de Coronel Fabriciano, no Vale do Aço. Caso a Justiça mineira não tome as devidas precauções, alunos e professores poderão retornar às aulas na próxima segunda-feira (25).
Segundo o vereador Marcos da Luz, que acionou nosso mandato para relatar a decisão, a situação é preocupante. “Esse retorno presencial às aulas vai contra a proposta de isolamento que as cidades estão vivendo e pode prejudicar o controle da pandemia em Minas Gerais”, afirma.
Como vice-presidente da Comissão de Educação da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, Betão fez um ofício acionando a Promotoria de Justiça de Coronel Fabriciano e pedindo informações sobre o retorno das aulas na cidade.
“Não podemos nem cogitar essa quebra da quarentena neste momento, com retorno das atividades dos alunos e professores. Por isso, enviei uma representação para que o órgão adote as medidas cabíveis para impedir o retorno das aulas da rede municipal de ensino”, disse Betão no documento enviado ao órgão.
Em contato com a Promotoria, fomos informados que já foi instaurado procedimento administrativo, contudo, o mesmo, até então, não está disponibilizado em meio digital e não temos como realizar consulta à distância.
“Como membro da Comissão de Educação, não posso admitir que isso venha a acontecer sem uma discussão com a comunidade. A voltas às aulas é um ato muito maior que simplesmente permitir o retorno às aulas. Estamos falando de quebrar regras sociais e decretos que estão ajudando as cidades mineiras a vencerem a pandemia”, lembra Betão.
Demais cidades mineiras sofrem com o acesso remoto e com a invisibilidade junto ao governo Zema
A líder de turma Vivian Vitória Gomes de Carvalho, do 3º ano do ensino médio da rede estadual da cidade de Vermelho Novo relata que muitas são as dificuldades de um ensino que não foi pensado para alunos como ela, que vivem no meio rural. Para ela, o programa “Se liga na Educação” é bom de nome, mas na realidade não conecta alunos e professores.
“Está sendo bem complicado, viu? Porque estamos no meio rural e alguns alunos não sabem nem como enviar um e-mail, nem sabem instalar um aplicativo”, relata a estudante que durante a pandemia confessa ter um trabalho a mais. “Tenho que ficar no pé dos colegas ensinando como faz, falando que tem atividade, cobrando os envios e ensinando como é mexer na internet”.
Apesar do trabalho, Vivian conta que se sente privilegiada. “Eu estou na roça e tem colega de sala que nem internet tem em casa”, desabafa preocupada. Eu passei a situação para o vice-diretor e creio que será entregue um material para esses alunos”, conta.
Na outra ponta da história está um professor da cidade que preferiu não se identificar. Diante das dificuldades enfrentadas pelos alunos, ele afirma que tem feito tudo o que pode mas que a realidade dos alunos da cidade não vai de encontro com a proposta de ensino do governo neste momento, e que até o ensino presencial pode ser um problema.
Cerca de 80% dos meus alunos são da zona rural. O Estado disponibilizou ferramentas para cadastro do e-mail dos alunos no Google mas a gente não consegue, aí usa o Gmail mesmo. Eu mando mensagens, mas há dificuldades no acesso e assim a gente vai levando", disse.
Outra realidade apresentada pelo mesmo professor é quanto ao envio do material didático aos alunos que não têm acesso à internet. “E se o agente falar que não vai levar e não tiver como entregar as apostilas, como faz?”, questiona.
De Pedro Leopoldo, Alice Franklin Marques Cunha, sofre para assimilar uma metodologia que ela não estava preparada para aprender. O problema vai desde a adaptação da forma como assistir às aulas, até em conter a ansiedade para tirar as dúvidas. “Eu estou tendo muitas dificuldades porque estou assistindo pelo celular, aí tem hora que os vídeos travam e eu não consigo entender o que a professora disse”, relata.
Na dificuldade, ela pede ajuda aos parentes mais próximos. “Eu acho que o tempo é pouco e que na maioria das vezes eu não consigo aprender as matérias sozinha, sem ter como perguntar a professora minhas dúvidas. Daí eu preciso perguntar a minha avó que é quem me ajuda”, desabafa.
Em Bicuíba, distrito de Raul Soares, também não é diferente. Atuante na rede estadual, Iussef Antonio Felipe Neto, professor de Filosofia da Escola Estadual Dom Helvécio Gomes, e também militante do Movimentos dos Atingidos por Barragens (MAB) e conta que já recebeu relatos de que alunos da região têm que se deslocar da sua casa para terem acesso aos estudos e que as dificuldades em modo remoto são imensas.
“Isso não é novidade, porque esse governo tem investido em saídas nada democráticas e uma delas é a privatização do estudo. Essa educação remota legitima a escola à distância e isso é um problema real para alunos e professores”, relata comentando que em alguns casos essa “tutoria” proposta pelo governo não atende os dois lados porque em tempos de pandemia, cada um tem um horário e não seria possível atender às dúvidas dos alunos em tempo real.
Realidade em números
Cerca de 700 mil alunos como os colegas da Vivian não tem acesso à internet. No Brasil, o percentual de brasileiros com acesso à internet aumentou no país de 2017 para 2018, passando de 69,8% para 74,7%, mas que 25,3% ainda estão sem acesso.
Em áreas rurais, o índice de pessoas sem acesso é ainda maior que nas cidades, chega a 53,5%. Em áreas urbanas é 20,6%.
A Rede Minas está presente em somente 186 municípios, sendo que temos 853 cidades em Minas.