As Escolas Famílias Agrícolas (EFAs) estão num esforço conjunto para manter a educação no campo; Betão defende que o Estado atue em defesa da manutenção dos trabalhos principalmente agora durante a pandemia
Alunos, diretores e representantes das associações das Escolas Famílias Agrícolas (EFAs) estão preocupados com a continuidade dos trabalhos realizados em suas unidades. É que até o momento, o Governo do Estado não repassou os recursos (janeiro até maio de 2020), garantidos em marcos regulatórios e leis estaduais e federais. Sem os repasses, a previsão é de que, só será possível manter as EFAs em funcionamento até o final deste ano.
“A situação se agrava a cada dia e o desafio é grande, pois existem EFAs com dificuldades de arcar com despesas básicas e também com os profissionais estão sem receber. Se a Secretaria de Educação não viabilizar uma forma de quitar esses recursos, gastos no primeiro semestre, as 22 EFAs localizadas em cerca de 200 municípios do Estado não terão condições de se manterem depois de dezembro de 2020”, reforçou o pedagogo Idalino do Santos, secretário-executivo da Associação Mineira de EFAs (AMEFA).
Para o deputado estadual Betão as escolas no campo devem ser assistidas de uma forma especial neste momento de pandemia, evitando que os alunos fiquem sem o acesso à educação na zona rural e que em um futuro, deixem de estudar próximo às duas comunidades. “As EFAs são fundamentais para as crianças e jovens que nasceram no campo e que desejam continuar sua forma de trabalho e produção no ambiente familiar. As escolas aproveitam as potencialidades dos alunos e incentivam a produção agroecológica e desenvolvimento local e sustentável, contribuindo de certa forma com a segurança alimentar e nutricional nessas comunidades”, disse Betão.
Na microrregião de Ponte Nova funcionam duas das 22 Escolas Família Agrícola, a EFA Paulo Freire, em Acaiaca, e a EFA Camões, em Sem-Peixe, ambas oferecem o Curso Técnico em Agropecuária Integrado ao Ensino Médio nas modalidades Regular e Educação de Jovens e Adultos.
O diretor da Paulo Freire, Gilmar Oliveira, lamenta também a falta de repasse dos recursos em Minas, que no caso de Acaiaca, possibilita pagar oito educadores da EFA Paulo Freire. Diante do cenário, ele mobilizou os estudantes e familiares a gravarem manifestos em vídeo cobrando da Secretaria de Educação e relatando a necessidade das escolas de educação no campo continuarem a funcionar.
“O governo tem o dever de transferir os recursos que vem de parte do Fundeb, é um direito dos camponeses, da juventude e de todos agricultores familiares. Só assim poderemos cobrir os custos, que tivemos de janeiro a maio de 2020, com material didático, alimentação, transporte, contas de água e energia, pagamento de pessoal”, reforça Gilmar.
A EFA Paulo Freire atende atualmente a cerca de 50 estudantes, sendo 26 homens e 24 mulheres, sendo em sua maioria afrodescendentes e de comunidades rurais ou tradicionais. Além de Goianá, os estudantes são oriundos dos municípios de Acaiaca, Piranga, Porto Firme, Paula Cândido, Guaianá Guaraciaba, Serra do Cipó, Congonhas, Senhora de Oliveira, Presidente Bernardes e Santa Bárbara.
EFAs atraem estudantes de municípios distantes em busca de uma educação diferenciada
As EFAs são escolas que tem uma metodologia própria que une as disciplinas exigidas em lei com a realidade local da vida no campo dos alunos e seus familiares. O processo de formação é contextualizado com o que os alunos vivenciam na prática nas suas casas na zona rural. No caso de Vitor Miranda, 17, que está no último ano do curso técnico na EFA Paulo Freire, em Acaiaca, ele aplica seus conhecimentos no assentamento Denis Gonçalves, em Goianá, cidade que fica a cerca de 230 km de distância.
“Por ser uma escola do campo, é bem próximo da realidade que vivemos. Por ser totalmente integrada à comunidade de Acaiaca, a gente desenvolve articulação com as pessoas, fazemos visitas aos moradores e viagens de estudos. Tudo isso contribui bastante para desenvolver a responsabilidade e a autonomia, pois viajamos e participamos de espaços de formação política como cursos e palestras”.
Além de Vitor, outros cinco jovens do assentamento do MST em Goianá, próximo à Juiz de Fora, se deslocam até seis horas para chegar até as duas EFAs na microrregião de Ponte Nova, mas “vale a pena” diz Tatiana Gomes, mãe de Pedro, 13, que começou a estudar neste ano na EFA Camões, no município de Sem Peixe, distante 40 km de Ponte Nova.
“As escolas trabalham baseado na pedagogia de alternância voltada à educação no campo e funciona assim eles ficam 15 dias na escola e depois 15 dias na comunidade pesquisando e aplicando na prática o que aprenderam onde moram. A escola é muito importante para nós, por isso vale a pena enfrentar a distância, pois os alunos têm até o ensino médio e se formam em um curso técnico” relata Tatiana, que divide com outra mãe de Goianá a tarefa de transportar e as despesas com combustível.
Durante as duas semanas que ficam na escola, eles tem um período na manhã na área produtiva, cuidam da horta, do pomar e da criação de animais, mas também realizam tarefas diárias para cuidar do espaço coletivo,segundo relatos de Tatiana. “Para nós do MST a divisão do trabalho entre os jovens e o cuidado com toda escola é muito importante, pois entendemos que o trabalho é um princípio pedagógico!”,conta.
“Queremos que nossos alunos tenham um exercício consciente da cidadania, com orientação profissional e possibilidade no prosseguimento dos estudos, a fim de contribuirem com a melhoria do meio social em que vivem e também na realização do projeto de vida dos jovens envolvidos”, disse o diretor Gilmar EFA Paulo Freire.
AMEFA luta em defesa do repasse de recursos do governo estadual às EFAs
As Escolas Famílias surgiram em Minas Gerais, em 1984, como resultado de movimentos autônomos de diferentes comunidades. Hoje no estado de Minas Gerais são 22 escolas, que empregam 400 profissionais e atendem2000 estudantes. As EFAs são escolas privadas de caráter comunitário pela Lei de Diretrizes e Base da Educação, cuja a gestão é feita por associações familiares. Todas essas associações das EFAs compõe a Associação Mineira das Escolas Família Agrícola (AMEFA).
As EFAs são mantidas por meio de uma “bolsa de estudo” anual repassada pela Secretaria de Estado de Educação, garantida pela Lei Federal 11.494/2007 (Lei do FUNDEB), que destina as instituições comunitárias EFAs parte dos recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).
A Associação Mineira das EFAs (AMEFA ) negocia, desde 2019, com a Secretaria Estadual de Educação o repasse de recursos garantido para as Escolas Familiares Agrícolas (EFAs). Ao final do ano de 2019 o governo disse que precisava adequar para 2020 o Programa de Apoio às Escolas Famílias Agrícolas do Estado de Minas Gerais (14.614/2003) , para enquadrar na Lei Federal 13.019/2014 e ao Decreto Estadual 47.132/2017.
Na ocasião a AMEFA apresentou previsão dos impactos negativos que poderiam inviabilizar a operacionalização e prestação de contas do Programa, mesmo assim a secretaria insiste na tramitação de um processo de mudança na operacionalização do Programa de apoio às EFAs.
“Toda a tramitação sempre foi feita pelo Programa (lei estadual), queremos que continue funcionando assim e seja pago inclusive os retroativos. Vale lembrar, que existem três normativas federais que legitimam a bolsa de estudo, o que permite ao Estado, flexibilizar o repasse, até que se adeque a legislação para um funcionamento digno do programa”, explica Idalino, secretário executivo da AMEFA. Os recursos mencionados são garantidos pela Constituição Federal, a LDB, Constituição Estadual de Minas Gerais, além de leis específicas 14.614/2003 e 11.494/2007.