Proposta de Regionalização tem prazo máximo de votação na Assembleia Legislativa previsto para julho; Betão vê com receio a discussão do tema sem análise junto aos municípios
O governo de Minas gastou quase todo o prazo de um ano para avançar na proposta de prestação dos serviços de saneamento no Estado de forma regionalizada sem que houvesse discussão com nenhum dos 853 municípios mineiros. O tema é desdobramento da Lei 14.026/20, aprovada no ano passado e que modifica o Marco Legal do Saneamento Básico no Brasil. Sancionado após 18 vetos, o texto passou a contar, inclusive, com propostas como a da estrutura de regionalização que está sendo construída no governo de Minas Gerais.
O prazo total para o estado contar com essa estrutura de regionalização é de um ano após a publicação da Lei 14.026, aprovada no dia 15 de julho de 2020. A gestão Zema criou um grupo de trabalho, composto por órgãos como Secretaria de Meio Ambiente (Semad), Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM), Secretaria de Planejamento, dentre outros, para construir a estrutura regionalizada da prestação dos serviços de saneamento básico no Estado. A ideia é fazer uma divisão em “agrupamentos de municípios”, levando em conta a viabilidade financeira, de modo a constituir atratividade para atuação do setor privado.
Os agrupamentos podem se dar por meio de Lei Complementar -criando novas regiões metropolitanas ou microrregiões de saneamento, ou por Lei Ordinária, criando Unidades Regionais de Saneamento. Esses agrupamentos contarão com estrutura de governança semelhante à das regiões metropolitanas existentes, transformando as decisões sobre saneamento básico em deliberações colegiadas, envolvendo o estado e o conjunto dos municípios de uma mesma unidade regional. Com isso, há um impacto direto na autonomia dos municípios, que passam a ter compartilhada a sua titularidade constitucional pelos serviços de saneamento.
Caso o Estado não cumpra o prazo de um ano, a União fará a regionalização, criando Blocos de Referências constituídos apenas de municípios.
A proposta está sendo construída de modo fechado pelo governo, à revelia dos municípios mineiros e da sociedade, tema que para Betão é muito preocupante.
“A aprovação da Lei 14.026 foi, a meu ver, em pontos específicos, a imposição da privatização do saneamento no Brasil. Por todo o mundo, países como a França que privatizaram o saneamento básico, um serviço que deve ser público, foram vítimas de processo de corrupção e também da piora na prestação do serviço”, avalia Betão, que destaca necessidade de debate com os municípios e, portanto, se posiciona contrário à urgência na apreciação do projeto que chegará à Almg.
O integrante do Observatório Nacional dos Direitos da Água e do Saneamento (ONDAS), Alex Aguiar, também vê com muita preocupação a falta de discussão com os municípios em Minas Gerais, e aponta que apesar da adesão às Unidades Regionais de Saneamento ser voluntária, os municípios que não aderirem à estrutura regionalizada perdem o acesso a recursos federais e financiamentos da União para investimento nessa e outras áreas. “A nossa luta no ONDAS é em defesa do acesso à água e ao saneamento básico, direitos humanos fundamentais, e para que esse acesso seja uma realidade para todos os munícios, promovendo a inclusão de todas as parcelas da população em situação de vulnerabilidade. Em Minas, os serviços são prestados de todas as formas: concessionária estadual, empresas e autarquias municipais, consórcios municipais, e também empresas privadas. Assim, essa discussão em torno de uma prestação regionalizada, feita por agrupamento, pode não levar em conta as particularidades e os interesses de todos os municípios e, por isso, merecia uma atenção mais detalhada do Estado”, avalia.
Entenda a Lei 14.026, que modifica o Marco Legal do Saneamento
Meta: alcançar a universalização dos serviços de saneamento até 2033, garantindo que 99% da população brasileira tenha acesso à água potável e 90% ao tratamento e à coleta de esgoto, reduzindo os despejos in natura em cursos-d’água.
Realidade: permissão de projetos como esse que será discutido em Minas Gerais que além de ocultar as particularidades, demandas e problemas dos municípios, pode levar à privatização dos serviços de saneamento básico em Minas.